quinta-feira, junho 20, 2019

O Colecionador – John Fowles



Resenha O Colecionador – John Fowles (Sem Spoilers)


“A vida é uma piada, é besteira levá-la a sério. Seja sério em sua arte, mas brinque um pouco sobre tudo mais.” p. 203


Depois de muito tempo com cópias esgotadas, O Colecionador ganhou nova edição no Brasil graças a DarkSide Books, que mais uma vez nos presenteou com seu habitual capricho, trazendo uma introdução de ninguém menos que Stephen King, conteúdos extras e acabamento perfeito, tornando o prazer de folhear o livro ir além da leitura.
Escrito em 1963 por John Fowles, a obra conta a história de Frederick Clegg, um jovem solitário de aparência frágil e voz serena, cujo hobbie é colecionar borboletas, porém, como se diz popularmente, as aparências enganam. Frederick esconde um segredo, ele é obcecado por uma jovem estudante de arte, Miranda Grey, que não suspeita de nada, mas cada um de seus passos e seus hábitos são monitorados e seu destino está prestes a mudar da forma mais drástica possível. O protagonista é funcionário público de uma pequena cidade da Inglaterra até que sua vida muda quando ele ganha na loteria, o que o possibilita comprar uma antiga casa afastada da cidade e começar seus planos para “conquistar” Miranda. Ressalto as aspas pois, seu plano de conquista consiste em sequestra-la e a manter confinada pois em sua mente, basta que eles passem um tempo juntos para ela o conhecer melhor e assim, quem sabe, se apaixonarem. E é para essa loucura que somos transportados logo nas primeiras páginas, sem enrolação e indo direto ao ponto.
O Livro é divido em três partes, sendo a primeira o ponto de vista de Frederick, seus pensamentos e conversas com Miranda e neles o autor trabalha muito bem os diálogos e todas as diferenças na forma de pensar e agir geram conflitos entre eles que refletem seus conflitos internos, de alguma forma nos fazendo sentir os traumas e os sofrimentos de cada um. Diferente do que imaginamos de um sequestrador, Clegg é sempre muito respeitador e dedicado, quase fazendo você se simpatizar por ele em alguns momentos e isso foi extremamente perturbador para mim pois me fez pensar em como poderia sentir empatia por um ser que comete uma atrocidade como a que ele cometeu? A escrita de Fowles, ao meu ver, se destaca principalmente por isso, pelos pensamentos e sentimentos conflitantes que me acompanharam ao longo da leitura. Para citar outro exemplo, Miranda me despertou certa irritação em seus momentos de arrogância e prepotência, quase me fazendo esquecer que ela é a vítima.
A segunda parte é um diário escrito pela própria Miranda enquanto prisioneira, obviamente mostrando o seu ponto de vista dos acontecimentos, suas percepções, seus planos de fuga e eventualmente acontecimentos de seu passado vão sendo melhor explorados e vamos nos dando conta da complexidade da mente dela, criando uma aproximação cada vez maior do leitor e consequentemente aumentando nosso desconforto com sua situação chegando ao ponto do progressivo desespero dela se tornar o nosso desespero. A sensação transmitida através da escrita dela é angustiante e claustrofóbica e de fato me peguei olhando a minha volta e pensando como seria se eu não pudesse sair dali tamanha foi minha imersão.
A terceira parte eu prefiro não revelar, não para aumentar a curiosidade, mas acredito que quanto menos se sabe dessa narrativa, mais instigante e apreensiva ela se torna. Fica a recomendação deste que foi para mim a experiência literária mais incômoda e angustiante da minha vida, e se isso não for o suficiente para te convencer, a obra inspirou não apenas o já citado Stephen King como outros mestres do suspense, como Neil Gaiman e Thomas Harris, esse último disse inclusive que seu livro, O Silencio dos Inocentes, só foi possível graças à O Colecionador. Apenas prepare seu psicológico e mergulhe nessa experiência que é tão incômoda quanto recompensadora.

Avaliação: 


💜💜💜💜💜

Sobre o Filme
O Livro ganhou uma adaptação em 1965 dirigido por William Wyler e estrelado por Terence Stamp e Samantha Eggar. Ao meu ver é um filme injustiçado, por não ser um típico filme nos moldes de Hollywood, poucas pessoas o conhecem, o que é uma pena já que se trata de um excelente filme e com relativa fidelidade ao livro. Digo relativa pois o livro é muito mais denso e complexo, explorando muito mais a psique dos protagonistas. Dessa forma, o filme é mais fácil de digerir e menos incomodo do que o livro se permite ser, mas definitivamente trata-se de um clássico do suspense que merece ser visto.

Trailer:


Rafa Ferraz

5 comentários:

  1. Nossa, amei a resenha,amei essa avaliação sobre o filme tbm. Confesso que prefiro a leitura sempre! rsrs vou adiciona-lo a minha lista de leitura. obrigada por partilhar seus sentimentos e conhecimento em palavras, é sempre um prazer ler! 💖

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    1. Conto nos dedos as obras cinematográficas superiores ao material de origem rs
      Obrigado pelo comentário ;)

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  2. Resenha maravilhosa, me fez sentir vontade de ler. Parabéns Rafa!!!👏👏👏

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  3. Que resenha, Rafa!! Parabéns e que orgulho de ter você aqui no Blog <3

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